quarta-feira, 4 de abril de 2012

Defeito permanente da visão atinge 822 mil na PB

Quem teve a sorte de nascer com a visão perfeita, deve estar consciente que, em alguma fase da vida, vai apresentar dificuldades de visão que, se não forem tratadas, podem até mesmo evoluir para a cegueira. A Organização Mundial de Saúde calcula que 500 mil crianças ficam cegas, no mundo, todos os anos, e 30% da população entre 0 e 15 anos  apresentam algum problema oftalmológico. Os riscos de se adquirir uma doença ocular, vai aumentando conforme a idade. Os especialistas são taxativos: depois dos 40 anos de idade, não há mais quem enxergue 100%. Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 822.813 paraibanos têm alguma deficiência visual permanente, ou seja, sem cura.

O vice-presidente regional da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO) e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Osvaldo Travassos de Medeiros, frisou que a maioria das doenças oculares é tratável e ressaltou a importância de exames oftalmológicos regulares como a melhor forma de prevenção. Ele ainda destacou que o cuidado com os olhos começa antes mesmo do nascimento e a primeira consulta deve ser feita ainda na maternidade, tendo acompanhamento a partir dos 2 anos de idade.  
    
 Teste do olhinho    
O oftalmologista Osvaldo Travassos de Medeiros alerta que os cuidados com a visão começam desde a gestação. Nos três primeiros meses, a mãe que contrair rubéola, por exemplo, pode afetar a visão do bebê, desenvolvendo patologias congênitas como catarata e glaucoma. Por tanto, ele destaca a importância de se fazer o teste do olhinho ainda na maternidade ou poucos dias depois do nascimento. O exame é indolor e é feito com um equipamento chamado oftalmoscópio, que emite uma luz e o especialista observa o reflexo nas pupilas.

 “A partir do teste, podemos observar de imediato se a criança nasceu com a pupila de cor diferente da vermelha. No caso da pupila branca, chamada leucocoria, a patologia pode ser uma catarata, um glaucoma ou outras formações que mostram alterações no olho do bebê”, explanou.

A oftalmologista Denise Freire Medeiros explicou que, por meio deste exame, podem-se detectar patologias como retinopatia da prematuridade, catarata congênita, glaucoma, retinoblastoma, infecções, traumas de parto e a cegueira. “Quanto mais cedo for detectada qualquer alteração e mais cedo for feito o tratamento, melhor será a recuperação e irá evitar que a criança cresça com baixas visuais e sejam prejudicadas no futuro”, ressaltou. 

O secretário de Estado da Saúde (SES), Waldson Souza, assinou, no ano passado, uma resolução aprovando os projetos de implantação dos Testes da Orelhinha e Olhinho na Paraíba, entrando em vigor na data de sua publicação, em 5 de julho. A resolução destaca a importância do Teste do Olhinho para detectar, precocemente, doenças oftalmológicas possibilitando tratamento rápido e evitando a cegueira infantil.  

Em João Pessoa, a maternidade Cândida Vargas realiza o teste, principalmente em prematuros, para diagnosticar qualquer patologia congênita. A oftalmologista Silvana Trigueiro, que faz o teste na unidade, explicou que é comum os bebês prematuros apresentarem a retinopatia da prematuridade, pois eles ainda não tiveram o tempo necessário para formar completamente o olho. “A retinopatia da prematuridade é causada pela falta de oxigenação no olho porque não nasceu totalmente desenvolvido, faltando a vascularização no local”, explanou.

O procedimento no caso da retinopatia é acompanhar o desenvolvimento da doença. Silvana explicou que em 90% dos casos, a retinopatia regride espontaneamente, entretanto Silvana ressalta que é importante ter o acompanhamento de um oftalmologista, pois a doença, se não tratada, pode levar à cegueira. Apenas em estágios mais avançados que é necessária a intervenção de laser. Já em casos de catarata e glaucoma congênitos, o procedimento deve ser intervenção cirúrgica imediatamente.  

O teste do olhinho também é importante para detectar infecções de toxoplasmose, sífilis, herpes, entre outros, assim como má formações congênitas. “É importante para começar o tratamento adequado, mas nem toda infecção pode ser recuperada, como em alguns casos de herpes. A lesão que tinha na retina antes não regride, mas o tratamento evita que aumente e, as inflamações não tratadas, podem causar atrofia ocular”, expôs. 

Em uma série de exames, na semana passada, Silvana diagnosticou dois novos casos de bebês com retinopatia da prematuridade. Outro prematuro apresentou cegueira decorrente de infecção do herpes contraída pela mãe durante a gestação. “Neste caso, não tem mais o que fazer. Ele ainda tem a visão periférica, mas a visão frontal não. Assim, ele irá ver apenas vultos”, disse.

A partir do teste, os pais já ficarão sabendo se a criança tem algum problema de visão. Assim, eles poderão começar a estimulação visual, que é uma espécie de fisioterapia ocular, para que a criança aprenda a enxergar. “Eu indico aos pais mostrarem objetos coloridos, como brinquedos e figuras. Também indico incentivar a criança a ficar desenhando, pintando, mesmo se ela não conseguir ver muito bem”, afirmou.

Para Silvana, o mais importante do teste é detectar doenças congênitas e infecções e tratar precocemente aquelas que são tratáveis, e deixar os pais conscientes das necessidades do seu filho, se ele precisará de escolas especiais e um cuidado especial. Se a criança não apresentar nenhum problema no teste, Silvana adverte aos pais a levarem seus filhos, a partir dos dois anos de idade, para consultas regulares com oftalmologista, mesmo sem haver queixas da criança, para acompanhar o desenvolvimento visual e, no caso de defeitos óticos, indicar tratamento adequado. 
      
Dificuldade de enxergar prejudica crianças na escola   
Aos 7 anos de idade, o olho já é clinicamente considerado adulto e, aos 40 anos, é idoso. A idade do olho adulto é a idade que as crianças começam a vida acadêmica e algumas não reconhecem que têm problemas na visão, dificultando o seu aprendizado. O oftalmologista Osvaldo Travassos de Medeiros alerta aos pais ficarem atentos às crianças em fase pré-escolar, agendando exames periódicos num oftalmologista.

No ano passado, Osvaldo propôs, em congresso da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SOB), a ideia de uma lei federal determinando que, todas as crianças para se matricularem pela primeira vez, no ensino fundamental e médio, devem levar um atestado de visão à escola. “Desta maneira, já vai ser selecionado a criança que precisa de um tratamento precoce e que o defeito ótico não venha a ser detectado tardiamente, quando já não há muito que fazer pelo olho da criança”, contou.

Ele explicou que, na fase pré-escolar, a criança pode ter defeitos óticos e, por isso, não enxergar bem. Ele citou a miopia, hipermetropia, astigmatismo e estrabismo, que é um pequeno desvio dos olhos, como exemplos de defeitos óticos. Os exames são importantes para tratar rápida e adequadamente o problema, evitando complicações no futuro. “O oftalmologista tem a chance de tratar uma criança com óculos e oferecer um tratamento adequado Tudo é tratado, da catarata ao glaucoma”, afirmou.

Osvaldo ainda disse que o exame pode detectar a ambliopia, conhecida por olho preguiçoso, que é quando o cérebro escolhe ver apenas por um dos olhos, deixando o outro esquecido. “A criança pode ter os dois olhos bons quando examinados individualmente. Com o exame, pode-se evitar que, na idade adulta, a pessoa tenha baixa visão de um dos olhos, caso bastante comum (4% da população mundial têm o problema)”, explanou.

A oftalmologista Denise Freire Medeiros citou que a falta de óculos no período escolar das é uma das principais causas de reprovação. Ela indica que a consulta com especialista deve ser marcada mesmo se a criança não apresentar queixas. “Algumas crianças vão para a escola, não conseguem enxergar de longe, tem problemas de aprendizado, não se socializam, e acabam reprovando apenas por que não foi detectado”, afirmou.

Doenças de cada fase da vida
Em todas as idades, as pessoas podem desenvolver diversos problemas de visão, como vícios de refração e erros na captação de luz que impendem de enxergar com nitidez. Os mais comuns são miopia (dificuldade de ver objetos de longe), hipermetropia (problema de ver objetos de perto), astigmatismo (visão com distorções e foco irregular), e a presbiopia, mais conhecida por “vista cansada” (dificuldade para enxergar tanto de perto como de longe). Estes defeitos podem ser corrigidos com uso de óculos.

Entretanto, o oftalmologista Osvaldo Travassos Medeiros explanou que há doenças que acometem as pessoas em determinadas fases da vida. Nos primeiros anos de vida, uma criança pode apresentar doenças congênitas como glaucoma e catarata, assim como desenvolver outras patologias, como retinopatia da prematuridade (crescimento desorganizado dos vasos sanguineos que suprem a retina, podendo descolá-la e ocasionar perda da visão) e retinoblastoma (tumor ocular que atinge a retina), todas detectadas no teste do olhinho.

Na infância, os defeitos óticos mais comuns são como miopia, hipermetropia, astigmatismo, todos tratáveis com uso de óculos, e estrabismo, que em casos mais graves, é tratado com cirurgia.

Na adolescência, Osvaldo explicou que, fora os defeitos óticos e conjuntivites, é muito comum ocorrer traumas oculares. Ele alerta que o jovem precisa ter muito cuidado quando for praticar esportes, para não ter pancadas nos olhos, que podem causar hemorragias, descolamento de retina e até mesmo grandes transtornos de fundo de olho, podendo chegar até a cegueira, apesar de raro.

“Hoje, é muito raro uma pessoa perder a visão porque os tratamentos estão mais avançados, a ciência evoluiu muito”, amenizou. Nesta fase, também pode aparecer o ceratocone: distúrbio que altera a curvatura da córnea e é considerada rara, que tem como fator de risco a hereditariedade. 

Na fase adulta, quando as pessoas começam a trabalhar, também começam a aparecer problemas de refração devido ao mau uso da visão. Osvaldo indica que o ambiente de trabalho deve ser bastante iluminado, o monitor do computador deve estar de 45 a 50 cm de distancia dos olhos, e a posição deve estar um pouco abaixo da linha do horizonte, nunca acima dos olhos, com limite de 30º acima. Também é importante evitar ler de pertinho para não forçar a musculatura dos olhos.

A partir dos 40 anos, o olho já é considerado velho e começam a surgir diferentes doenças, assim como problemas de refração. Aos 40 anos, o ser humano precisa distanciar um pouco a leitura para maior nitidez, isso é chamado de presbiopia, ou vista cansada, que é quando o olho não está mais conseguindo fazer uma focalização de perto, exigindo um complemento de óculos. Depois dos 40 anos que também aparecem a catarata e o glaucoma, ambas tratáveis.

Além da catarata e glaucoma, a degeneração de mácula é também uma patologia que acomete os idosos, afetando a parte do fundo de olho responsável pelos detalhes, surgindo geralmente em pacientes acima dos 70 anos. “Por causa da longevidade, muitas patologias da visão estão surgindo, pois antigamente as pessoas morriam mais cedo. Assim, as pesquisas vêm mostrando que algumas doenças no fundo do olho são inerentes à idade”, afirmou, Osvaldo.

Osvaldo explicou que algumas doenças, como diabetes e hipertensão arterial, podem desenvolver doenças nos olhos, como a retinopatia diabética, ocasionando o descolamento da retina. Uma ocorrência, considerada grave, que pode acometer idosos e pessoas com hipertensão arterial é a trombose venosa do olho, um acidente vascular que, se não tratado na fase inicial, pode levar à intensa baixa visual.

Para uma boa saúde ocular, Osvaldo indica a ingestão de vitaminas, sais minerais, alimentação balanceada e bem conduzida, enfim, manter hábitos de vida saudáveis. É importante um cuidado geral da saúde, praticando exercícios e condizente à idade.  

A catarata atinge toda a população idosa
A catarata é uma doença oftalmológica que atinge toda a população idosa, com maior ou menor intensidade. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a principal causa de cegueira no mundo é a catarata, representando 51% do total de casos. Segundo o IBGE, a Paraíba tinha, no último Censo em 2010, 926.162 pessoas acima dos 40 anos, idade em que começa a surgir a patologia. Em estado avançado, o tratamento é cirúrgico, oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A médica oftalmologista Denise Freire Medeiros explicou que a catarata é uma doença decorrente do envelhecimento do cristalino, que é uma lente natural localizada por trás da íris, a parte colorida do olho. Quando nascemos, o cristalino é transparente, que, ao decorrer dos anos, vai perdendo esta característica e fica endurecida. Segundo ela, a catarata é mais comum em pessoas acima dos 40 anos e que toda a população idosa desenvolverá a doença, mudando apenas a intensidade e a idade quando surgirá. 

“Catarata é a diminuição da transparência do cristalino, onde a causa mais freqüente é o envelhecimento. Como costumo brincar com meus pacientes, a catarata é igual a cabelo branco, chega para todo mundo. O que muda é quando ela aparece, em alguns pode vir mais cedo e em outros mais tarde; e também a intensidade, outros mais discretos, outros mais intensos”, explanou.

Não existe tratamento preventivo da catarata, entretanto Denise informou que uma dieta balanceada e hábitos de vida saudáveis podem retardar o seu surgimento. “Não existe tratamento clínico para evitar, é como o envelhecimento, que não há como evitar. Assim, a alimentação equilibrada, manter hábitos saudáveis e praticar exercícios físicos regularmente ajudam a prevenir a doença, mas não evitá-la”, afirmou.

A exposição ao sol também pode ser prejudicial à saúde dos olhos, aumentando as chances do aparecimento de uma catarata precoce. Denise exemplificou que, em localidades com grande incidência solar, a frequência da doença é maior do que em localidades com menor incidência.     

Tratamento da catarata é apenas cirúrgico
O tratamento da catarata é apenas por cirurgia, procedimento que substitui o cristalino por uma lente específica. Anteriormente, era feita uma grande incisão no olho para chegar ao cristalino, retirá-lo, e trocá-lo pela lente. Denise explicou que o procedimento usado hoje é uma pequena incisão por onde o equipamento quebra e suga o cristalino. Pelo mesmo local, o equipamento injeta a lente. A cirurgia com esta técnica dura em média 10 minutos, se o cristalino não estiver solidificado, ou seja, não esteja em estado avançado.

 “A lente entra dobrada e, ao entrar, um gel específico faz com que ela se abra e a gente a reposiciona. É usado apenas um colírio anestésico e o paciente não precisa usar o tampão e já sai enxergando. Passamos só um protetor transparente para ser usado na hora de dormir, para o paciente não coçar o olho”, relatou.
Existem vários tipos de lente que podem ser usadas no procedimento. Denise disse que, dependendo do perfil e necessidades do paciente, pode ser usada uma lente que oferece a correção do grau do paciente, ou seja, já vem com a medida do grau do paciente. “Não retira a necessidade de utilizar os óculos, mas corrige bastante”, disse.

Porém, Denise garante que a cirurgia com qualquer lente recupera totalmente a visão do paciente, com exceção daqueles que têm outros problemas visuais. “A recuperação visual é 100%, desde que o paciente não tenha outros problemas. Um diabético, por exemplo, por causa da doença, pode ter outras causas para a baixa visual. A recuperação da visão requer a saúde do olho como um todo”, ressaltou.

O oftalmologista Osvaldo Travassos de Medeiros expôs que depois dos 55 anos, as pessoas têm pelo menos o início da doença e nesta fase muitas optam por não fazer cirurgia porque mantém a visão funcional, com uso de óculos, indo para cirurgia apenas quando a visão é comprometida. “Se a pessoa precisa ter mais visão e exigência visual, a catarata mesmo no começo é operada. Porém, o mais comum é as pessoas ficarem mais motivadas à cirurgia quando a catarata estiver prejudicando a visão”, afirmou.     

Glaucoma
Além da catarata, o glaucoma é uma doença oftalmológica comum na Paraíba. A Organização Mundial de Saúde (OMS) relatou que a segunda maior causa de cegueira no mundo é o glaucoma, com 8% dos casos registrados. O oftalmologista Osvaldo Travassos de Medeiros alertou que a população acima dos 40 anos deve ficar atenta e se consultar regularmente com especialista, pois o glaucoma é uma doença assintomática e, quando o paciente sente alguma coisa, o quadro é grave, podendo levar à cegueira.   

O glaucoma é uma degeneração dos nervos óticos, ou seja, a morte das células destes nervos, causada pelo aumento da pressão intraocular, mas também por falta de oxigenação no local, causada pela má circulação sanguínea ou alterações vasculares que diminuem a quantidade de sangue que chega aos nervos. Osvaldo explicou que a doença tem caráter hereditário. “Pais com glaucoma têm grandes chances dos filhos terem a doença. Quando encontro a doença em um paciente, alerto aos familiares para também fazerem o exame”, informou.   

No início da doença, o tratamento é feito com colírios específicos. Quando não funciona, o oftalmologista usa um laser, que facilita o escoamento do humor aquoso e controla a pressão ocular, que resolve na maioria dos casos. Em última instância, caso nenhum dos procedimentos anteriores resolva o problema, é que o paciente passa por cirurgia.   

Quando o quadro da doença é grave, a pessoa sente fortes dores no olho, que fica avermelhado. Também vai perdendo a visão periférica e, se não tratado, pode vir a perder toda a visão. “O que foi perdido no glaucoma, continua perdido. Nestes casos, o tratamento é para estacionar a perda de visão”, explanou.

“Fui dormir vendo e acordei cega”

A bibliotecária Ana Lúcia Leite perdeu a visão aos 20 anos de idade, sem nenhuma explicação. Ela relatou que um dia acordou sem enxergar e os médicos disseram que o caso dela pode estar relacionado a um forte trauma na cabeça. “Deslocou tudo do meu olho e os especialistas disseram que isso só ocorre quando a pessoa sofre uma forte pancada na cabeça, como em acidentes de carro, mas eu não sofri nada, nem dor de cabeça tinha. Com 20 anos fui dormir vendo e acordei cega”, lembrou.

Ana Lúcia relatou que, no começo, entrou em depressão profunda e passou dois meses de cama, sobrevivendo à base de soro. Graças ao apoio da família, principalmente de sua mãe, ela conseguiu superar o desafio. A mãe a acompanhou, vindo morar em João Pessoa, para que ela tivesse uma vida diferente “Tive que reaprender a viver. Precisei aprender tudo novamente: andar, ler, escrever”, lembrou.

Ela contou que também recebeu grande apoio no Instituto dos Cegos, apesar de ter sido relutante em procurar ajuda. “Quando a gente chega ao instituto, chegamos revoltados com a vida, com Deus, com tudo. Chegamos culpando todo mundo, precisando de muito apoio, principalmente de psicólogos, e tive tudo isso no instituto, do porteiro aos professores, todos me ajudaram e me apoiaram”, contou.

Além de perder a visão, Ana Lúcia disse que perdeu muitos dos amigos da época, que se afastaram dela por não compreenderem o seu problema. “Não perdemos apenas a visão, mas perdemos os amigos, o namorado. A maioria dos amigos se afasta, quando te vê, ficam com pena. Muitos dos meus amigos da época se afastaram, não porque não gostavam mais de mim, mas porque eles não sabiam como se comportar. Na época eles me viam e ficavam chorando, e eu já estava chorando, e isso atrapalhava. Eles eram companheiros de lamentação”, relatou.

Para Ana, ficar cega deu outra oportunidade de vida. Antes, ela não gostava de estudar e, após o problema, se dedicou mais aos estudos e hoje tem várias especializações e pretende ingressar num mestrado. Ela disse que se apaixonou pelo Braille e que teve grande facilidade de aprender o alfabeto dos cegos. Ela também conheceu o seu marido na Associação dos Cegos, quando trabalhava lá, e estão casados há 16 anos. “Foi amor a primeira voz”, brinca. Eles têm um filho de 12 anos que enxerga normalmente.

Para Ana, perder a visão depois de certa idade é difícil, principalmente para lidar com atividades do dia a dia, pois o medo de obstáculos é maior. Ela destaca que, ao perder a visão, ela passou a “enxergar” o mundo com outros olhos, prestando atenção a detalhes que, anteriormente, passariam despercebidos, como os cheiros específicos de cada local. 

“Meu esposo, por exemplo, perdeu a visão com seis meses e ele conta: ‘como posso ter falta de uma coisa que não conheço?’. Ele anda e vai para todo lugar e não tem o medo que tenho dos obstáculos. Ele andava de bicicleta e desde pequeno era normal ver o mundo com as mãos. Comigo não, eu aprendi algumas coisas só depois de cega, como os cheiros dos lugares. Hoje só pelo cheiro eu sei que estou na Lagoa. Quando a gente enxerga não prestamos atenção em certos detalhes”, explicou.

Ana ressalta a importância do teste do olhinho e do acompanhamento médico para evitar que as crianças percam a visão. “É bem mais fácil se cuidar cedo. Não sei se no meu caso, se eu morasse na Capital e tivesse tido acompanhamento médico, poderia ter sido evitado”, disse.

A professora Elizete de Araújo Pereira perdeu a visão aos seis meses de idade e acredita que sua cegueira pode ter sido causada por alguma infecção ou doença, como ela morava no interior e não tinha acesso às unidades de saúde, não tem a certeza da causa. Apesar de ter perdido a visão muito cedo, ela conta que teve uma infância normal, como de qualquer outra criança que cresce no sítio, com muito contato com a natureza. “Sempre fui curiosa e nunca deixei de fazer nada por causa da minha condição. Como eu não via, aprendi e conheci as coisas tocando”.

Ela começou a estudar aos 11 anos, quando chegou ao Instituto dos Cegos. Nos anos 70, começou a dar aula e hoje é professora de técnicas de Braille e Soroban, método que ensina matemática aos cegos. “Acredito que a pessoa quando perde a visão muito cedo tem mais problemas de aprendizado, porque ela não teve as experiências que uma pessoa que vê teve. Eu não sei o que é escuro, claro, ou as cores. Quem vê aprende duas vezes, já quem não vê aprende com o toque, com os sons”, disse.

Já Juarez Manoel da Silva nasceu com visibilidade muito baixa e enxerga apenas sombras e vultos. Ele contou que, em sua família, dos 11 filhos, sete nasceram com deficiência visual. Como Elizete, ele cresceu no sítio e sempre foi tratado como uma pessoa “normal”, a única diferença foi que ele não teve a chance de estudar mais cedo. “Vim estudar no Instituto aos 15 anos e meu irmão aos 12. Outros irmãos nem puderam estudar, por serem mais velhos”.

Ele acredita que a pessoa que perde a visão mais tarde tem mais dificuldade em se adaptar. “Tem também a questão da aceitação. É muito difícil a sociedade aceitar o cego. O mercado de trabalho é muito escasso, as empresas privadas não dão abertura. O que nos ajudam são os concursos públicos”, disse.

 NÚMEROS DA PARAÍBA

IBGE Censo 2010

População residente - Tipo de deficiência permanente - Deficiência visual - não consegue de modo algum     8.649            Pessoas

População residente - Tipo de deficiência permanente - Deficiência visual - grande dificuldade             142.371            Pessoas

População residente - Tipo de deficiência permanente - Deficiência visual - alguma dificuldade            671.793            Pessoas

Doenças de cada fase da vida
  • Crianças:
Catarata Congênita – É o cristalino opaco, limitando a captação de luz pelos olhos, diminuindo a visão. É decorrente de infecções (rubéola, toxoplasmose, sífilis, entre outras), hereditariedade ou má formação. A principal característica são as pupilas esbranquiçadas.

Glaucoma Congênito – Má formação no sistema de drenagem do humor aquoso. Os principais sintomas são lacrimejamento, dificuldade em tolerar claridade, perda de brilho da região da íris e aumento do volume do globo ocular.

Retinopatia da Prematuridade – Crescimento desorganizado dos vasos sanguíneos que suprem a retina. Quanto mais prematuro e menor peso, maior é a possibilidade de o bebê apresentá-la.
Retinoblastoma – Tumor ocular que atinge a retina. As crianças com até 2 anos e meio são as mais acometidas pela doença.
  • Adolescência
Ceratocone – Distúrbio que altera a curvatura da córnea, deixando-a pontiaguda. É raro e tem a hereditariedade como fator de risco.
  • Adultos e Idosos
Catarata – Opacificação do cristalino e atinge toda a população a partir dos 40 anos. Principais sintomas são a visão embaçada e diminuição visual.

Glaucoma – Degeneração do nervo ótico causada pela pressão alta intraocular. Inicialmente é assintomática, detectada apenas em exames oftalmológicos. Em quadro grave, os sintomas são dor forte nos olhos, vermelhidão e pouca visão periférica.

Degeneração Macular Relacionada à Idade – Acomete pessoas acima dos 70 anos e afeta a região central da retina, a mácula, no fundo de olho, responsável pela visão dos detalhes. Os sintomas são manchas no campo de visão.

Retinopatia Diabética – Causada pela diabetes, os vasos sanguíneos do olho são afetados por hemorragias ou proliferação dos neovasos, que geram o descolamento da retina.



Fonte: Jornal Corrreio

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