sexta-feira, 29 de abril de 2011

O tratamento dispensado à criança ao longo da história


A humanidade tem dispensado à criança um tratamento legislativo que se coaduna com a compreensão do significado da infância presente em cada momento histórico. Já em seus primórdios, os homens praticavam várias formas de violência à criança, “desde os egípcios e mesopotâneos, passando pelos romanos e gregos, até os povos medievais e europeus, não se considerava a infância como merecedora de proteção especial”, muitas vezes contando com o beneplácito da própria legislação e da cultura dominante.

 Ao tempo do Código de Hamurábi (1700 a.C-1600 a.C), no Oriente Médio, ao filho que batesse no pai havia a previsão de cortar a mão, uma vez que a mão era considerada o objeto do mal. Também o filho adotivo que ousasse dizer ao pai ou à mãe adotivos que eles não eram seus pais, cortava-se a língua; ao filho adotivo que aspirasse voltar à casa paterna, afastando-se dos pais adotivos, extraíam-se os olhos. Em Roma (449 a. C), a Lei das XII Tábuas permitia ao pai matar o filho que nascesse disforme mediante o julgamento de cinco vizinhos (Tábua Quarta, nº 1), sendo que o pai tinha sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e de morte e o poder de vendê-los (Tábua Quarta, nº 2). Na Grécia antiga, as crianças que nascessem com deficiência eram eliminadas nos Rochedos de Taigeto. Em Roma e na Grécia a mulher  e os filhos não possuíam qualquer direito. O pai, o Chefe de Família, podia castigá-los, condená-los à prisão e até excluí-los da família.

É no final do século XVIII que a infância começa a ser vista como uma fase distinta da vida adulta. Até então, participavam das mesmas atividades. As escolas eram freqüentadas por crianças, adolescentes e adultos. Com o surgimento do entendimento de que a infância era uma fase distinta da vida adulta também passam a ser utilizados os castigos, a punição física, os espancamentos através de chicotes, paus e ferros como instrumentos necessários à educação. Na Inglaterra, em 1780, as crianças podiam ser condenadas à pena de enforcamento por mais de duzentos tipos penais.

Somente em 1871, é fundada em Nova York a Sociedade para a Prevenção da Crueldade contra as Crianças, a partir do caso da menina Mary Ellen. Mary Ellen era uma menina órfã de mãe, abandonada pelo pai, que sofreu severos maus-tratos na família substituta. O fato causou profunda indignação na comunidade da época que percebeu não haver um local própria destinado a receber este tipo de denúncia. Em razão disto, o caso da menina Mary Ellen foi denunciado na Sociedade para a prevenção da Crueldade contra os Animais. Necessitou ser equiparada ao animal para que seu caso pudesse ser examinado pelo Tribunal da época. Pouco tempo depois, na Inglaterra, é fundada uma sociedade semelhante, voltada a proteção da criança.

No Brasil, a situação da criança não foi diferente. Contam os historiadores que as primeiras embarcações que Portugal lançou ao mar, mesmo antes do descobrimento, foram povoados com as crianças órfãs do rei. Nas embarcações vinham apenas homens e as crianças recebiam a incumbência de prestar serviços na viagem, que era longa e trabalhosa, além de se submeter aos abusos sexuais praticados pelos marujos rudes e violentos. Em caso de tempestade, era a primeira carga a ser lançada ao mar. Até o advento da Constituição Federal de 1988, a criança não era considerada sujeito de direitos, pessoa em peculiar fase de desenvolvimento e tampouco prioridade absoluta. A partir de 1988, no Brasil, passamos a contar com uma legislação moderna, em consonância com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, inaugurando uma nova época na defesa dos direitos daqueles que ainda não atingiram os dezoito anos de idade.


 A chegada da criança ao sistema de Justiça: de onde provêm os encaminhamentos?

Os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra a criança chegam ao Sistema de Justiça através do Conselho Tutelar ou nos disputas familiares envolvendo guarda, visitas ou processos de suspensão e destituição do poder familiar.

Dentro do contexto sócio-jurídico-cultural construído pela humanidade, ao longo dos tempos, torna-se indiscutível que a nova postura do ordenamento jurídico brasileiro, alicerçada em documentos internacionais, em especial a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, e assinada pelo Governo brasileiro, em 26 de janeiro de 1990, promulgado pelo Decreto Presidencial 99.710, de 21 de novembro de 1990, passou a constituir-se em um instrumento incentivador e facilitador do enfrentamento da violação dos direitos à criança, em especial, à violência intrafamiliar.

Cabe ao Conselho Tutelar receber, entre outras situações de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente, os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos praticados contra a referida população, mostrando-se de extrema urgência a sua criação e instalação, em todos os municípios, “para a efetivação da política de atendimento à criança e ao adolescente, tendo em vista assegurar-lhes os direitos básicos, em prol da formação de sua cidadania”.

Maria Regina Fay de Azambuja
Parte do artigo>VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR: É POSSÍVEL PROTEGER A CRIANÇA?
Fonte: BuscaLegis.ccj.ufsc.br

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