quinta-feira, 3 de maio de 2012

Poupança muda e vai pagar 0,70% da Selic


 
Foto: Getty Images
Mantega anunciou o ajuste: "mudança é mínima, caderneta continua com a mesma simplicidade"

Um senhor interrompeu o almoço do presidente da Ordem dos Economistas do Brasil, Manuel Enríquez Garcia, nesta quinta-feira (3), num restaurante do Ipiranga (SP). Queria saber se iam mexer no dinheiro dele, pois ouviu que o governo mudaria as regras da poupança, o que de fato foi anunciado há pouco em Brasília. “Expliquei que não iam mexer no valor que ele tem, apenas tornar a poupança parecida com as outras aplicações, que estão perdendo rendimento – e que isso é bom para o País”, diz Garcia.

Como esperava o senhor do restaurante e boa parte do mercado financeiro, a poupança mudou. O anúncio foi feito pelo Ministro da Fazenda, Guido Mantega, por volta das 18h. A Medida Provisória que altera a caderneta deve ser publicada amanhã no Diário Oficial da União.

Atualmente, a poupança rende 0,5% ao mês, mais a Taxa Referencial (TR), o que resulta num rendimento anual de aproximadamente 6,17%. A nova regra determina que, se a taxa básica de juros (a Selic, atualmente em 9%), que é definida a cada 45 dias pelo Banco Central, cair para 8,5% ou abaixo disso, o rendimento da poupança passa a ser de 0,70% da Selic.

A mudança só vale para depósitos feitos a partir de amanhã (4), conforme antecipou a coluna Poder Econômico. O dinheiro aplicado na caderneta antes desta quinta-feira seguirá a regra "antiga" mesmo se a Selic ficar igual ou menor a 8,5%. A poupança continua isenta do Imposto de Renda. "É uma mudança mínima, a caderneta continua com a mesma simplicidade e versatilidade", disse Mantega.

A mudança tem como objetivo permitir que o governo siga reduzindo o juro básico, para estimular a economia. A redução da taxa dá impulso ao consumo e ao crédito, além de reduzir o custo da dívida pública, atrelada ao índice. Desde agosto passado, a equipe econômica vem cortando a Selic, que chegou a 9% após a última reunião do Copom. Mas a poupança passou a ser um obstáculo para novas reduções.

Isso porque os títulos da dívida pública são indexados à Selic. Se ela caísse mais, esses títulos ficariam menos atrativos que a poupança e o governo teria dificuldade para emitir novos papéis e rolar a dívida. A Ordem dos Economistas do Brasil calculou, num exercício de simulação, que sem mudanças na poupança a Selic só poderia cair até 8,5%. “Seria o valor mínimo suportável pelo mercado, mas poderia haver migrações (dos títulos para a poupança) mesmo antes de esse valor ser atingido”, diz Garcia.

Repercussão positiva
Lideranças de diferentes setores apoiaram a medida. A avaliação de Garcia é de que o ajuste, do ponto de vista macroeconômico, é positivo. “Baixar os juros e, para isso, mexer na poupança, é uma das variáveis para melhorar a economia”, diz. O deputado Paulo Pereira da Silva, da Força Sindical, também considera a mudança positiva. "Como não mexe na caderneta de quem já poupava, nós apoiamos a alteração", diz. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, também disse apoiar as alterações, para evitar que os recursos dos fundos de investimento migrem para as cadernetas.

Para Garcia, não deve haver migrações importantes nas próximas semanas, nem para dentro nem para fora da poupança. “A maioria das contas são de pequenos investidores, que não fazem movimentos rápidos atrás de maior rentabilidade”. Ainda assim, ele avalia que pode haver algum impacto. “Quem ganhar um dinheiro extra e achar que a poupança está pagando pouco possivelmente vai alocar os recursos em renda variável, ou simplesmente usá-los para realizar algum desejo de consumo”, diz.

Nelson de Souza, professor de Economia do Ibmec, prevê cenário parecido. "Não acho que vá haver muita migração para outros investimentos. O brasileiro não tem a cultura de fazer isso, está acostumado a deixar o dinheiro na poupança, não faz muita conta", diz. Roy Martelanc, economista da Fundação Instituto de Administração (FIA), também acredita que a mudança não deve provocar migrações de uma aplicação para outra. “Quem aplica em poupança não tem costume de se arriscar em outras aplicações, são pessoas com um perfil mais cômodo. Como a nova regra muda pouco a remuneração, não deve ter nenhum movimento”, diz.

A “trava” que faz a regra valer somente quando a Selic fica abaixo de 8,5% serve para que o governo não precise mexer novamente nas regras caso a taxa básica volte a subir. “Isso faz todo o sentido”, diz Martelanc. “Ainda que a tendência atual seja de queda dos juros, o governo inevitavelmente vai precisar aumentar a Selic no futuro. Quando isso acontecer, a indexação funcionará como uma trava de alta, para que os poupadores não comecem a ganhar muito acima do que eles já estariam satisfeitos,” diz.

A nova regra não altera o financiamento imobiliário, que é feito com parte dos recursos captados pela caderneta. Mantega afirmou que continua valendo a regra que determina que 65% dos recursos da poupança são destinados ao crédito imobiliário, setor em que há forte demanda no momento atual. "Não haverá redução de funding para o sistema habitacional", afirmou Mantega.

Para Garcia, o Governo tem agora uma espécie de obrigação de baixar a Selic. “Se as autoridades mexeram na poupança, dando rendimento menor para os poupadores, para poder cortar mais a taxa básica de juros, agora é justo que o faça, para que todos ganhem com a medida”, diz o economista. “Se não, os donos de caderneta etrão rendimento menor, mas não colherão nenhum benefício”.

O Brasil tem atualmente 105 milhões de contas poupança, que somam R$ 431 bilhões aplicados. Para comparação, existem R$ 510 bilhões em fundos de renda fixa. “A caderneta continua sendo a melhor opção para a maioria da população brasileira”, afirmou Mantega


Fonte: IG

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